Qualquer pesquisa científica, como qualquer atividade humana, está sujeita a erros. Podem ser erros devido a descuidos do pesquisador, problemas com equipamentos ou simplesmente por causa de especificidades dos sujeitos da pesquisa. Por isso é tão importante que as pesquisas sejam repetidas – ou replicadas – pelo mesmo pesquisador e por pesquisadores diferentes. E replicadas de modo idêntico (replicação direta) ou com pequenas modificações (replicação sistemática). Isso permite que os erros sejam descobertos, divulgados e possam, assim, ser evitados no futuro. Daí a importância da publicação dos chamados resultados negativos, falhas na obtenção dos mesmos resultados originais em uma replicação. Tudo isso é quase senso comum na Física, Química e Biologia. Mas não parece ser assim na Psicologia.
Uma matéria no blog do jornal inglês The Guardian chamou atenção para o assunto: “Está na hora dos psicólogos colocarem sua casa em ordem.” A matéria trata de um novo periódico, BMC Psychology, que propõe ‘colocar menos ênfase em níveis de interesse’ e publicar estudos de replicação e resultados negativos. O Prof. Irismar Reis de Oliveira (UFBA) é um dos editores de seção e concedeu uma entrevista ao periódico. O artigo de Keith R. Laws, intitulado “Negativland – a home for all findings in psychology“, publicado no mesmo periódico trata especificamente da questão. O resumo (traduzido) do artigo é o seguinte:
A Psicologia tem sido historicamente assolada pela pouca publicação [under-reporting] tanto de replicações quanto de resultados nulos. A evitação desses ingredientes essenciais da prática científica implica que a literatura psicológica está, sem dúvida, distorcida. O viés na psicologia é generalizado e sistêmico, afligindo pesquisadores, revisores, editores e periódicos, todos unidos na busca pelo novo e pelo curioso à custa do confiável. A psicologia, portanto, opera de uma maneira estranha às outras ciências, com ligações entre replicabilidade e credibilidade aparentemente muito mais fracas. Outros problemas decorrem da maneira distorcida com que a psicologia atualmente opera – incluindo supervalorização de resultados [spinning findings], viés de publicação, e, infelizmente, fraude completa. Esses problemas representam um sério desafio para os psicólogos colocarem sua casa em ordem – e um passo para tanto é certificar-se que replicações e resultados nulos encontrem um lugar seguro na psicologia ao invés de permanecerem nossos pequenos segredos sujos que corroem ainda mais a credibilidade da nossa ciência.
Uma iniciativa semelhante, iniciada já há algum tempo, é o site PsychFile Drawer, um “arquivo de tentativas de replicação na Psicologia Experimental”.
Uma iniciativa posterior ao lançamento do BMC Psychology foi a do periódico Perspectives on Psychological Science, da Associação para a Ciência Psicológica (EUA). O periódico passará a publicar um novo tipo de artigo: RELATO DE REPLICAÇÃO REGISTRADO (registered replication report). Mais informações podem ser acessadas aqui.
Por fim, além de ser um problema sério para a Psicologia como uma ciência como um todo, realizar replicações de modo sistematizado pode ser um bom tipo de trabalho de iniciação científica para futuros pesquisadores. Também por isso, deveríamos investir mais em estudos como esses.
PS: A dica sobre o Perspectives on Psychological Science foi de Gehazi Ramiris, a quem agradeço.
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